Pela minha mesa, sentados à minha frente já passaram: Discussões entre A. Adams e E. Atget, não vale a pena, eles não se entendem; Uma reflexão profunda acerca de cadeiras com A. Kertész; Um chá de camomila bebido com K. Blossfeldt, só com muita camomila é que se conseguem aqueles pormenores todos; Uma troca de ideias interessante e excêntrica com V. Oldoini.
Perto da minha mesa, de pé e encostado à janela, está, com copo de vinho do porto na mão e a olhar para o exterior, E.A. Poe. Vai repetindo de tempos a tempos, abanando ligeiramente a cabeça e falando entre dentes "isto é tudo um sonho, ...e que raio de sonho".
Há ainda um som continuo e presente, vem da casa de banho, não é preocupante, é apenas M. Duchamp a tentar arrancar a sanita do chão. Alertei-o que agora as coisas são mais complicadas, ele ri-se e sem olhar para mim responde "complicadas sempre foram".
Encolho os ombros e regresso à mesa, fico surpreendida.
Quem lá tenho sentado hoje?
D. Moriyama e H. Sugimoto. Wow! Isto promete. O primeiro a beber café, o segundo bebe chá branco. Falam do instinto quase irracional, da velocidade quase loucura até à abstração, redução ao essencial, espiritualidade e até, quem sabe, de transcendência.
Sento-me junto deles em silêncio e devagar, 
não quero perturbar nem que seja só um grão de pó que esteja neste ar. 

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