Sentada em cadeira de ferro, cotovelos no rendilhado da mesa e as mãos a segurar a cabeça.  
Perdida, esquecida, ouve o diálogo das folhas com o vento por cima da sua cabeça, segue o retorcido branco e lascado da mesa com os olhos, não percebeu que ele estava ali até ouvir a sua voz: - Que se passa menina? Levanta os olhos para a cara, vê uns óculos que teimam em deslizar pelo nariz, um ar sério pontuado por uma barba rala. 
É a primeira vez que se rompe a cortina da invisibilidade e tem o homem que melhor fotografou um pimento a olhar para ela. Habitualmente vagueia nestes cenários vestida de cinzento, naquela tonalidade que ninguém vê.
Baixa os olhos, retoma parcialmente aos sons das folhas e responde: - Rompeu-se a minha bolha...
Ele olha em redor, parece esperar alguém que não chega e sem qualquer curiosidade: - Bolha? Tem uma Bolha? 
- Sim, uma  bolha que era só minha, um universo de imagens, fechado hermeticamente, com pressão positiva... rasgou-se.
- Porque se rasgou?
(Porque permiti. Pegou-me na mão, entramos na casa museu de "Sonhos elétricos" (P.K.Dick), ele tinha em si uma pitada de "A ignorância" (M.Kundera), tinha todas as cores (H.Murakami),  era um número primo (P.Giordano) e um quadrado (E.A.Abbott). "Entre um homem e uma mulher, entre os dois polos, ou a eletricidade crepita ou não crepita. ...Sem e não há conjunção." (J.M. Coetzee)  .  Porque eu permiti."
Ela responde num segundo: - Não sei. 
Weston parece agora ligeiramente interessado. - E agora?
Cravando as unhas nas palmas das mãos responde: - E agora, e agora, nada! Espero, esterilizo o espaço, voltará a fechar-se, ...por segunda intenção é certo mas, fechar-se-á. Era escusado... Mas é o que é.
Ele ri-se, ela sorri e dizem ambos: - Sim era excusado...
Levanta-se e ao afastar-se ainda olha para trás e relembra-lhe:  - As formas menina, concentre-se nas formas, esqueça o conteúdo, esqueça a função.
As formas.
https://www.metmuseum.org/art/collection/search/283282
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(Holga 120n, Ilford hp5, 2022)

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